Escrever sobre experiências gastronômicas é algo muito prazeroso, pois reviver o sentimento de comer algo maravilhoso pela primeira vez sempre é algo que interessa ao leitor, em especial aqueles que pretendem viver isso. Degustar, comer se lambuzar, nesse caso. Comida é isso, aroma, sabor, texturas e sentimentos.
É natural e está incrustado em toda cultura a comemoração ser feita com comida e bebida. Desde o início da civilização até os dias de hoje, todas as datas importantes e festivas são comemoradas com o alimento, simples ou suntuosas, mas são comemoradas. Eu mesma tenho um pequeno ritual, quando consigo algo que estava querendo muito que se realizasse, eu comemoro com uma comida que eu amo. Também há o oposto, quando estou triste ou frustrada eu como algo que me faça me sentir melhor.
O prato que eu escolho para todos os momentos, é um prato chinês, melhorado pelos japoneses e que foi de suma importância na reconstrução desse país assolado pela segunda guerra mundial. Após a derrota na segunda guerra, o povo estava passando muita fome, e os EUA ajudou enviando insumos e entre eles estava a farinha de trigo. Mas vamos voltar um pouco mais no tempo. Os registros do aparecimento do ramen no Japão, remontam os tempos feudais, aonde era feito com trigo sarraceno e servido somente a classe alta da época. Então, conhecido como sobá chinês.
Os monges budistas japoneses trouxeram ao Japão a técnica de moagem e do corte da massa da China, e hoje conhecemos como sobá. Antes disso eram cozidos como bolas de trigo, assados e servidos em outros formatos. Existem muitas histórias e datas para esse acontecimento, mas vamos ao que interessa. O ramen atual.
O ramen atual, que consumimos em larga escala ao redor do mundo, começou por volta de 1900 (transição a Era Meiji), em Yokohama e se chamava sobá chinês, feito com caldo de frango, e nessa época a fome já era algo bem conhecido, devido as guerras internas e transição, aonde mudou a sociedade japonesa na época, como a abertura do Japão ao ocidente. O arroz, alimento principal do povo japonês também era escasso e caro. O consumo da carne ainda era um tabu devido a religião. E claro, eram somente as classes mais abastadas que consumiam.
O “boom” do ramen surgiu no Japão com os lámen instantâneos, que eram a nova imagem dessa transição, do sistema antigo a um salto gigantesco a modernidade. Uma comida rápida e acessível a todos. O novo “ritmo” era intenso e se fazia necessário a facilidade dos preparos dos alimentos e a rapidez no consumo da mesma. Pronto, o “miojo” foi a cara do modernismo no Japão e conhecido no mundo todo, como a comida do milênio. E sem dúvidas, a era do macarrão instantâneo tende a ser “milenar”. Quem nunca comeu um “miojo” que atire o primeiro bowl.
O ramen, de poucos anos para cá, tornou-se uma grande tendência nos restaurantes, com grandes especialistas, chefs e profissionais da gastronomia que inovam e atendem a necessidade de cada país. Por ser uma comida mais versátil, a facilidade de criar um ramen é muita mais fácil que outros pratos da comida japonesa. Outro motivo para a grande repercussão desse prato, foram os animes e doramas japoneses que difundiram esse prato a pessoas de todas idades, em especial as crianças que clamam por um ramen do Naruto.
O fácil acesso a esse prato que varia entre 25 reais e até 85 reais aqui no Brasil, tem cativado um público que procura conhecer várias casas de ramen pelo país, com o maior núcleo em São Paulo, que tem o maior número de casas especializadas, chamadas no Japão de “ramen-ya”. São conhecidos como ramen lovers, os amantes de ramen, que procuram sempre novidades e aquecer o coração com um fumegante e saboroso bowl de ramen. Donburi, tchawan, wan ou bowl. O recipiente que comporta o ramen tem vários nomes. O caldo fumegante, quando próximo as narinas tem o aroma inebriante e antecede as expectativas do que virá. A colher, quando cheia, levada a boca nos remete a lembranças e nos trazem conforto. Os óleos aromáticos presentes nessa composição, explodem na boca. A massa, longa quando tragada com o caldo é um espetáculo de sabores e texturas. O topping, na medida, é um adereço de extremo bom gosto.
Independente de como degusta o seu ramen, ou lámen não importa como o chame, deve ser algo reconfortante, feito em casa com macarrão instantâneo, artesanal ou improvisado, com ovos de gema dura ou mole, caldo de legumes ou caldos de mais de doze horas de cozimento, chashu de carne ou tofu, cebolinha, moyashi, narutomaki, e um óleo temperado para finalizar, a essência está em como será degustado. Deve ser um trago largo, um abraço, uma lembrança. Um restauro no corpo e na alma.
Para conhecer um pouco mais sobre essa cultura alimentar, está em cartaz a exposição “A arte do ramen Donburi” do dia 18 de outubro á 5 de fevereiro de 2022 na Japan House SP NA Avenida Paulista 52.
Dito (escrito no caso) tudo isso, irei indicar nesse artigo alguns locais em São Paulo que podem comer ramen, e escolher qual é o seu favorito, e depois nos contar sua experiência.
ASKA LAMEN
Rua Galvão Bueno 466
Indico sempre começar por esse, o mais tradicional de São Paulo. Somente aceita dinheiro ou pix. Chegar cedo, sempre tem fila.
KOMEI
Rua Thomaz Gonzaga 65, Liberdade
TAMASHII
Rua Mourato Coelho 53 Pinheiros
BARIKOTE TONKOTSU LOVERS
Rua José Maria Lisboa 118 Jardim Paulista
JOKEMPO
Av. Dr Cardoso de Melo 1309 Vila Olímpia
BRAZILAMEN
Rua Barão de Iguape 158 Liberdade
Serve poucos ao dia, precisa ir cedo e pegar senha, não funciona todos os dias então precisa ver no Instagram os horários.
HIRÁ
Rua Fradique Coutinho 1240 Pinheiros
JOJO RAMEN e JOJO LAB
Rua Dr Rafael de Barros 262 Paraíso
Rua Gandavo 193 Vila Clementino
MISOYA
Rua Antônio Carlos 324 Consolação
LAMEN KAZU
Rua Thomaz Gonzaga 87 Liberdade
MOMO LAMEN
Rua dos Estudantes 34 Liberdade
BODOGAMI
Av. Da Liberdade 456 Liberdade
Michele Dupont, conhecida como ramen girl, viveu alguns anos o Japão trabalhando somente com japoneses, onde teve imersão total a cultura e alimentação local, e se apaixonou por esse prato. Ao voltar ao Brasil, sentiu a necessidade de divulgar a culinária japonesa fora do circuito sushi sashimi, em especial a cozinha quente, os macarrões japoneses, carnes, gyudon, donburi e as comidas de izakaya que são os gastrobares ou botecos japoneses. Após concluir a faculdade de gastronomia, trabalhou como chef de cozinha em alguns restaurantes em Curitiba, atualmente ministra cursos de culinária japonesa em São Paulo e faz consultorias gastronômicas. Também, estuda pós-graduação em História da Alimentação. Escreveu o primeiro livro nacional sobre ramen, “Ramen receitas para Estrangeiros”, com receitas e algumas histórias de sua vida no Japão. De forma simples e de coração, com os olhos de uma ocidental, trabalhou as receitas com insumos que podemos encontrar com facilidade no Brasil. Também foi convidada pela Jetro São Paulo para apresentar o programa “Sabor do Japão” para a rede Bandeirantes no canal “Sabor e Arte da Band tv”, sobre macarrões japoneses e karê, em cápsulas passadas entre os programas, uma forma da Jetro divulgar a cultura alimentar japonesa. Participou de live e podcast com a Quickly Travel, Cônsul Takagi Masahiro (na época cônsul do Japão na região Sul), Live sobre macarrões japonês pela Jetro e podcast pelo Paladar Distinto. A convite da presidente do Comissão de Gastronomia do Bunkyo, faz parte da equipe voluntária. Recentemente recebeu um convite inusitado, apresentar pratos japoneses do dia a dia dos japoneses, para o público brasileiro, no programa da rede aberta Band TV com o Chef Edu Guedes, onde ensinou karaage, tonkatsu e yakissoba, assim mostrando outro lado da culinária japonesa, mais simples e acessível a todos. Atua na área como consultora gastronômica e professora de culinária japonesa.
Atualmente trabalha em São Paulo, com workshop, cursos e divulgação da gastronomia japonesa e restaurantes, voltada a todos os públicos, em especial ao público brasileiro para melhor compreensão da cultura alimentar japonesa, deixando de fácil acesso e entendimento sobre os sabores característicos do Japão, baseado em sua experiência de vida com imersão a cultura.
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